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sábado, 20 de setembro de 2025

Guiné 61/74 - P27232: Felizmente ainda há verão em 2025 (35): os vinhos verdes que aprendemos a gostar na guerra: Casal Garcia, Aveleda, Gatão, Três Marias, Lagosta, Palácio da Brejoeira (...sem esquecer o Mateus Rosé, da Sogrape)


Rótulo (histórico) do vinho verde Gatão, da Sociedade dos Vinhos Borges & Irmão Lda. Um dos vinhos verdes que consumíamos na Guiné, em garrafa tipo cantil. A sua história remonta a 1895. Deve ser uma das marcas mais antigas.


Casal Garcia, da Aveleda, Penafiel. O mais conhecido na Guiné, ao tempo da guerra colonial. A marca nasceu em 1939. È a marca de vinos verdes mais vendida em todo o mundo.



Outro vinho verde apreciado, em garrafa tipo cantil, o "Três Marias", das Caves Casalinho,  Vizela A empresa foi fundada em 1944.  Esta marca foi lançado em 1956.



Vinho verde branco, "Lagosta", da Real Companhia Vinícoal de Portugal. Rótulo.  É uma das marcas mais antigas (1902). POertecne hoje à Enoport Wines.




Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 (1972/73) > Legenda: "Nesta foto está o Figueiral em frente (ao meio) de óculos escuros e a comer uma cabritada com a garrafa de Casal Garcia à frente. Eu estou do lado esquerdo da foto (...).. De costas para a foto está o Pinto Carvalho. Do lado direito da foto, em primeiro plano está o alferes Bastos, o homem do obus (alf de Artilharia) e logo a seguir, portanto à esquerda do Figueiral, está um segundo tenente de que não me recorda o nome. Era habitual haver um abastecimento via barco por mês e que vinha sempre escoltado pela Marinha, ficando o Oficial instalado lá no quartel [em Bedanda, na margem esquerda do Rio Cumbijã]" 

Foto (e legenda): © António Teixeira (1948-2013) Todos os direitos reservados. Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Caramadas da Guiné (2013). 




Hélder Sousa, ribatejano do Cartaxo
ex-fur mil de trms TSF
 (Piche e Bissau, 1970/72)

 
1.  O verão está a chegar ao fim... Acaba amanhã, no calendário; dia 22, segunda feira,  já é outono (astronómico), prolongando-se até 21 de dezembro.

As vindimas também acabaram en Candoz. Já fizemos o nosso vinho. Já nas cubas de inox. E ainda entregámos maos 3 toneladas e tal  de uvas na Aveleda, em Penafial,  a  empresa de que somos fornecedores há muitos anos...Uvas de altíssma qualidade (arinto ou perdená, como se diz aqui, mais azal)... Sem um único cacho podre ou seco... Estão com  13,8 graus de álcool provável, segundo as medições da Aveleda.

Estamos, na região dos vinhos verdes,  ainda em plena azáfama... Ainda há vizinhos a vindimar. Fica bem, por isso,  falarmos um pouco dos vinhos verdes, se não se importarem os nossos leitores... Vinhos verdes de que só ouvimos falar (e provar), muitos de nós, na Guiné... 

(...)  "De Piche, em termos de Messe também não me lembro como era. Sei que cá fora, no Tufico, bebia cerveja. Mas no Quartel lembro-me bem de "estrear" Alvarinho "Palácio da Brejoeira". 

Nunca tinha bebido (para mim 'vinho verde' era Casal Garcia e similares) e isso foi possível porque um dos Capitães era uma pessoa de gostos refinados (até mandou vir, a suas custas, um aparelho de ar condicionado que mandou montar no quarto)  e fez com que fossem fornecidas algumas caixas e, como uma delas se "partiu",  lá tivemos a sorte (eu, o vagomestre cúmplice e mais uns dois ou três esforçados companheiros) de experimentar esse vinho. E gostei! (...) (*)

2. "Palácio da Brejoeira", alvarinho (só para capitão de "gostos refinados" e oficiais superiores...) e "Casal Garcia" (para alferes e furriéis milicianos): já temos duas marcas de "vinho verde" que se consumiam no CTIG.

Aliás, foi na Guiné que muitos de nós,"mouros",  "sulistas", começaram a apreciar o vinho verde branco: quem ainda não se lembra de marcas históricas, para além do Casal Garcia e do Palácio da Brejoeira ? Quem não se lembra  do Aveleda,  Casal Garcia, Três Marias, Garcia,  Lagosta, Gazela, Casal Mendes, etc. ?

A malta do Norte, de Minho e Entre-Douro-e-Minho, estava habituado ao "verde tinto", boa parte dele de fraca qualidade,  proveniente de castas locais como o  bom "vinhão" mas também de "produtores diretos", como o Jacquet, ou Jaquê, e o "americano",  hoje completamente banidos...

3. Acaba de se assinalar os 117 anos da publicação da Carta de Lei de 18 de Setembro de 1908, que instituiu a Demarcação da Região dos Vinhos Verdes, uma das mais antigas na Europa, a segunda em Portugal, a seguir à Região Demarcada do Douro, a mais antiga região vitícola regulamentada do mundo (remonta a 1756).

Lê-se no novo portal sobre os Vinhos Verdes, da CVRVV (Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes), que "curiosamenmte, ao contrário da imagem que hoje apreciadores de todo o mundo têm do Vinho Verde, terão sido, sobretudo, tintos, os vinhos que começaram por trazer fama à região".

Foi a partir de finais do século XIX que os vinhos brancos, elaborados a partir das castas locais, começaram a ser apreciados nos grandes centros urbanos.

Foi preciso esperar pela "guerra colonial", para os vinhos brancos ganhassem uma crescente quota quer na produção, quer na exportação. Os vinhos verdes tintos ficaram progressivamente remetidos a um consumo maioritariamente local (o que durante muitos anos também foi uma "injustiça": hoje recomeçam a ser "descobertos", têm de resto uma enorme importância na culinária local...

Decisiva, neste processo de "renascimento" dos vinhos verdes brancos , foi "a investigação efetuada a partir dos anos 60 e 70, que não apenas estudou em profundidade as variedades brancas autóctones (castas como Loureiro, Trajadura, Arinto ou Alvarinho, por exemplo), como revolucionou a forma como se plantavam e conduziam as vinhas na região, fazendo a transição de uma viticultura de subsistência, focada no mercado regional, para uma viticultura profissional, orientada para o mercado nacional e de exportação" (Fonte: portal da CVRVV).

Os vinhos verdes brancos portugueses começaram a ganhar maior projeção, inclusive no Ultramar, a partir dos anos 60 e 70, momento em que marcas como Aveleda, Casal Garcia, Gatão, Lagosta, Três Marias e Palácio da Brejoeira se tornaram presenças constantes em restaurantes, cantinas e messes militares do império colonial, acompanhando também o Mateus Rosé—embora este último não seja técnica e legalmente um vinho verde.





Na cantina de Nova Sintra, em meados de 1970, o vinho verde (da Aveleda)  custava à volta de 8 euros (a preços de hoje), o equivalente a metade de um garrafa de uísque bovo (16 erups), segundo documentos disponibilizados peloa Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70). 

Em 30 de junho de 1970, havia 221 garrafas de vinho verde em "stock", no valor de cerca 4,7 mil escudos (preço médio de custo=21,2 escudos). Uma refeição em Bafatá (bife com batatas fritas e ovo a cavalo) andava à volta dos "vinte pesos".

Nesse mês de junho de 1970 venderam-se 4 garrafas de Mateus Rosé, a 20$50 cada uma (de 15 requisitadas em armazém). Mas de 17 garrafas de vinho Aveleda (requisitadas,em armazén) não se vendeu nenhuma...


Fonte: Excerto de Balancete da Cantina, 30 de Junho de 1970, CCAV 2483, "Os Cavaleiros de Nova Sintra".


4. Marcas icónicas no Ultramar

Aveleda e Casal Garcia (produzidos pela Aveleda) destacaram-se por serem vinhos leves, frescos, fáceis de beber, com baixo teor alcoólico e enorme aceitação em climas quentes, como os de Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.

Gatão, Lagosta. Três Marias, etc., tornaram-se marcas populares, apostando em vinhos brancos jovens, relativamente acessíveis em África...

Palácio da Brejoeira consolidou-se como símbolo de prestígio, sobretudo o seu Alvarinho, sendo mais apreciado por elites e em ocasiões especiais.

Mateus Rosé, embora não seja vinho verde, fez história como um vinho jovem, acessível, e amplamente consumido no Ultramar e internacionalmente (era serviço nba TAP), alcançando notoriedade após as décadas de 50 e 60 em restaurantes, missões diplomáticas e unidades militares portuguesas em África.

Lembro-me de outras marcas em Bambadinca, no bar de Sargentos (que era bem fornecido): Gazela, Campelo, Casal Mendes (das Caves Aliança, hoje Bacalhoa)... 

Nunca bebi o "Palácio da Brejoeira", alvarinho: era raro e caro... Mesmo assim os verdes brancos masi correntes não eram baratos: andavam, pelos 25 escudos nas nossas messes e cantinas (e, se bem recordo, 35, nos restaurantes em Bafatá). Não bebiam todos os dias, longe disso: bebia-se em dias especiais, festas de aniversário, por exemplo.

Mas os nossos leitores, camaradas desse tempo, têm por certo recordações que vão partilhar connosco.

(**) Último poste da série > 16 de setembro de 2025 > Guiné 61/74 - P27222: Felizmente ainda há verão em 2025 (34): Mata-mouros e outros apelidos e alcunhas, raros, exóticos, pícaros, brejeiros, etc.

terça-feira, 19 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27133: Efemérides (465): 21 de Julho, Dia da Arma de Cavalaria, comemorado em 1970, em Nova Sintra, com rabanadas (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre)


1. Em mensagem de 24 de Julho de 2025, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), enviou-nos uma efeméride do dia 21 de Julho de 1970, Dia da Arma de Cavalaria, passado em Nova Sintra.


O 21 de JULHO – DIA DA ARMA DE CAVALARIA e as RABANADAS, têm algo em comum?

Aparentemente não, mas será conveniente ler o texto que se segue.

Prestei serviço militar na Guiné de 01 de Março de 1969 a 22 de Dezembro de 1970, integrado numa Companhia de Cavalaria, a 2483, denominada por Cavaleiros de Nova Sintra, que pertencia ao BCAV 2867, sediado em Tite.

O dia 21 de Julho de 1970 foi passado no mato, em Nova Sintra, dia esse que esteve efetivamente ligado às rabanadas. Isto porque no reabastecimento mensal de géneros frescos, os tais que só davam para três dias, sobraram algumas dúzias de ovos, poucas, que não davam sequer para meio ovo por militar numa refeição. Para que os ovos fossem repartidos igualmente por todos (uma companhia tem mais ou menos 160 homens), resolvi mandar fazer rabanadas e desta forma comemorar a data festiva do Dia da Cavalaria, tanto mais que eu fazia nesse dia 24 anos.

O padeiro, o José Manuel Bicho teve um trabalho extra ao fazer o pão, tipo cacete e os homens da cozinha o Gonçalves e o Gonzaga, auxiliados pelos seus ajudantes deram início à “Operação Rabanada”. As fatias de pão estiveram de molho em vinho tinto, como convém e depois for embebidas em ovo batido. Na cozinha ao ar livre, iniciou-se a fritura das ditas.

Deviam ser umas três da tarde e o pessoal juntou-se à volta das fritadeiras e não arredou pé, lambendo os lábios com o cheiro da iguaria.

Mas de repente tudo mudou. Os rapazes do PAIGC vieram participar na festa, dando inicío a uma flagelação ao quartel, a uma hora não muito habitual, porque era no final do dia que costumavam visitar-nos. Ouvidos os primeiros tiros da célebre arma automática, por todos conhecida por “costureirinha”, pois tinha um matraquear parecido com uma máquina de costura, bem como o som caractrístico da saída das granades de morteito e do canhão sem recuo, disparadas longe do arame farpado, os esfomeados bateram em retirada procurando refúgio nos abrigos e nas valas onde, por vezes, resultava equimoses na cabeça e uns arranhões nos braços.

Na ânsia da fuga, o pessoal bateu com as pernas nas compridas pegas das fritadeiras, tombando-as, originando que o petisco caísse no pó do chão de terra da cozinha. Durante a flagelação ouviam-se as granadas das armas pesadas do PAIGC a silvar o céu, cruzando o aquartelamento, indo cair e rebentar com estrondo lá para os lados da bolanha. Contrariamente a outras flagelações desta vez não acertaram no alvo. Foi um susto que durou perto de dez minutos, não tendo havido feridos ou danos materiais.

Passda a tempestade veio a bonança com a malta a regressar ao local do crime (junto das fritadeiras). Só que rabanadas limpas e comestívéis havia poucas, porque a grande maioria ficou polvilhada de pó de terra, parecendo canela e até esmagadas devido à debandada. Mas ainda assim os mais gulosos e corajosos pegaram as rabanadas do chão e com todo o cuidado tiraram a terra envolvente e com meio dúzia de sopradelas, passaram a ter um petisco delicioso, sempre acompanhado por uma ou mais garrafas de cerveja de 0,66.

Terminada a festa foi tempo de tomar banho e aguardar as cinco da tarde para o jantar. Findo este, o pessoal ficou na conversa, próximos dos abrigos, prontos para o que desse e viesse, por vezes sob o magnífico luar africano, contando anedotas e discutindo os jogos de futebol, ou escrevendo à família, aos amigos, à namorada ou madrinha de guerra. Também, por vezes, ansiosos aguardavam o regresso dos camaradas que haviam saído para um patrulhamento.

Como curiosidade refiro que o Dia da Cavalaria, a nível de Batalhão foi celebrado em Jabadá, onde se encontravam os camaradas da CCAV 2484, os Dragões de Jabadá.

Aníbal Silva

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Nota do editor

Último post da série de 4 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27087: Efemérides (464): 4 de agosto de 1969, o "adeus às armas", ou o dia em que o T/T Uíge apitou.... seis vezes, antes de zarpar (Virgílio Teixeia, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAQÇ 1933, Nova Lamego e São Domingos, 1967/69)

terça-feira, 12 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27114: Blogpoesia (806): Versejar em Nova Sintra - 3: "Nova Sintra", pelo Cap Fonseca e Silva da CCS/BCAV 2867 (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Alimentação)

Vista aérea de Nova Sintra

1. Em mensagem de 1 de Julho de 2025, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), enviou-nos alguns versos alusivos a Nova Sintra.
Publicamos hoje "Nova Sintra", da autoria do (então) Capitão Fonseca e Silva da Companhia de Comando e Serviços do BCAV 2483.



VERSEJAR EM NOVA SINTRA - 3

NOVA SINTRA

Em largo de areia e terra,
No meio de mata cerrada,
Vivem homens em buracos
Na corrida do tempo passado!

Fazendo dum sorriso
Uma boa e larga anedota!
Fazendo duma palavra dada
Conversa para dias e anos!

Em casa de chapa e tronco
Vivem homens de olhos encovados,
Sempre os mesmos, meses e meses,
Na amizade sã dos deserdados.

Olhando outros em local farto
De quartos limpos em parede caiada,
Não olham com inveja ou enfado,
Mantêm a noção de camarada!

Na singeleza destas quadras
Vai o amor de um poeta pelintra
Que sentiu o que outra devia sentir
Em terras de Nova Sintra.

Autor
Capitão Fonseca e Silva


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Breve história sobre a razão de ser destes versos

O Capitão Fonseca e Silva foi o Comandante da CCS do meu Batalhão, o BCAV 2867, que esteve sediado em Tite nos anos 69/70.
Por divergências havidas com o Comandante do Batalhão, Tenente Coronel Trinité Rosa, o Capitão como castigo ou punição foi desterrado durante duas semanas para o quartel de Nova Sintra. Pela leitura das duas últimas quadras conclui-se que os versos lhe são dirigidos.
De referir que o Comandante do Batalhão nunca passou qualquer noite em Nova Sintra, bem como o Capitão de Operações do Batalhão, o médico e até o Padre. O único que lá esteve durante uma semana foi o 2.º Comandante, o Major Martins Ferreira.

Aníbal Silva
Arcozelo/Gaia 01 de Julho de 2025

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Nota do editor

Último post da série de 5 de agosto de 2025 > Guiné 61/74 - P27093: Blogpoesia (805): Versejar em Nova Sintra - 2: "Despedida de Nova Sintra", por Manuel Gouveia de Oliveira, Soldado Atirador (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Alimentação)

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Guiné 61/74 - P27093: Blogpoesia (805): Versejar em Nova Sintra - 2: "Despedida de Nova Sintra", por Manuel Gouveia de Oliveira, Soldado Atirador (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Alimentação)


1. Em mensagem de 1 de Julho de 2025, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), enviou-nos alguns versos alusivos a Nova Sintra.
Publicamos hoje a "Despedida de Nova Sintra" da autoria do Soldado Atirador Manuel Gouveia de Oliveira, o "Xabregas".



VERSEJAR EM NOVA SINTRA - 2

Não me recordo de haver muitos militares a fazer versos e a havê-los não os davam a conhecer.
Eventualmente enviavam as suas “obras” à mãe, à esposa, à namorada, ou à madrinha de guerra.

Mas recordo com muita saudade o amigo Xabregas, sempre bem disposto e risonho, soldado atirador de Cavalaria de seu nome completo Manuel Gouveia de Oliveira que, sobre qualquer tema ou pretexto, repentinamente fazias as suas quadras. De várias que ele compôs, partilho com os camaradas do blogue, as duas únicas que tive a oportunidade de guardar.



DESPEDIDA DE NOVA SINTRA

Dezassete chegam bem para quem tem
Esta missão cumprida
Por isso eu digo agora chegou a hora
De merecermos a partida

Vamos todos pra Bissau, que já não é mau
E dormir
descansadinhos
Vamos entregar a farda camufleda
Porque já somos velhinhos

Adeus Nova Sintra, nunca mais quero voltar
Saudade são meus desejos
Mas tu não leves a mal.

Adeus Bissau, também não quero voltar
Quero ir para a mimha terra
Quando a missão terminar.

Marchando na escuridão, em paliçadas
Em qualquer operação
Sempre unidos e velozes as nossas vozes
Nunca disseram que não

Adeus Nova Sintra
Colunas a S. João
Adeus Mata do Jorge
Uanadim e Brandão


Autor
Manuel Gouveia de Oliveira
Soldado Atirador de Cavalaria
CCAV 2483

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Nota do editor

Último post da série de 29 de julho de 2025 > Guiné 61/74 - P27068: Blogpoesia (804): Versejar em Nova Sintra - 1: "Marcha de Nova Sintra", por Manuel Gouveia de Oliveira, Soldado Atirador (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Alimentação)

terça-feira, 29 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27068: Blogpoesia (804): Versejar em Nova Sintra - 1: "Marcha de Nova Sintra", por Manuel Gouveia de Oliveira, Soldado Atirador (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Alimentação)


1. Em mensagem de 1 de Julho de 2025, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), enviou-nos alguns versos alusivos a Nova Sintra.
Publicamos hoje a "Marcha de Nova Sintra" da autoria do Soldado Atirador Manuel Gouveia de Oliveira, o "Xabregas".



VERSEJAR EM NOVA SINTRA - 1

Não me recordo de haver muitos militares a fazer versos e a havê-los não os davam a conhecer.
Eventualmente enviavam as suas “obras” à mãe, à esposa, à namorada, ou à madrinha de guerra.

Mas recordo com muita saudade o amigo Xabregas, sempre bem disposto e risonho, soldado atirador de Cavalaria de seu nome completo Manuel Gouveia de Oliveira que, sobre qualquer tema ou pretexto, repentinamente fazias as suas quadras. De várias que ele compôs, partilho com os camaradas do blogue, as duas únicas que tive a oportunidade de guardar.


MARCHA DE NOVA SINTRA

Defendemos Nova Sintra
Com muito orgulho e altivez
Pertencemos à companhia
Que é, a dois quatro oitenta e três

Aqui vai Nova Sintra
Que vai a Tite pra dar nas vistas
Andam por aqui e além
À procura dos terroristas

Terroristas venham cá
Que nós estamos à vossa espera
Agora não são catanas
Nós temos armas da nova era

Terroristas, Terroristas
Nova Sintra está cá
Se precisarem de ajuda
Nós iremos a Jabadá

Defendemos Nova Sintra
Com muito orgulho e presunção
Pertencemos à Companhia
Que é a melhor do Batalhão

Viva a nossa Companhia
Que é a melhor do Batalhão
Viva o nosso Homem Grande
Que é o nosso CAPITÃO


Autor
Manuel Gouveia de Oliveira
Soldado Atirador de Cavalaria
CCAV 2483

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Nota do editor

Último post da série de 21 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26602: Blogpoesia (803): No Dia Mundial da Poesia: "A Noite Mundial da Poesia", por Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547 / BCAÇ 1887 (Canquelifá e Bigene, 1966/68)

terça-feira, 22 de julho de 2025

Guiné 61/74 - P27045: (De) Caras (236): Sobrenomes invulgares dos militares do BCAV 2867 (Aníbal José da Silva, ex-Fur Mil Alimentação)

1. Em mensagem de 1 de Julho de 2025, o nosso camarada Aníbal José Soares da Silva, ex-Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70), enviou-nos um texto com sobrenomes invulgares de militares do seu Batalhão.


SOBRENOMES INVULGARES DE MILITARES DO BCAV 2867

APÓS CONSULTA DA HISTÓRIA DA UNIDADE

No ano de 1962, na Escola Comerial de Oliveira Martins, tive um professor de Português que era um colecionador apaixonado por diversas coisas. Uma das suas coleções consistia em obter e registar nomes invulgares, mas reais, de indivíduos.

Na altura fixei alguns nomes, que agora não lembro, mas há um que ficou gravado na minha memória. E o nome é “José Casou de Calças Curtas”, de um brasileiro, está bem de ver. Por outras fontes registei outros nomes, também reais e que são: António Pancadas Acabado; Um Dois Três de Oliveira e Quatro; Pedro Penedo da Rocha Calhau, Pica Sinos e Aurora da Liberdade Viva a Républica.

Em tempos, em conversa com amigos sobre o tema e sabendo que no meu Batalhão (BCAV 2867) havia sobrenomes de camaradas, também invulgares, consultei a História da Unidade e daí resultou a seguinte lista:

Cuco
Galinha Jorge
Toucinho
Tarrinca
Cabeceira
Birrento
Calção
Chambrinho
Poupada
Bicho
Parracho
Paquim
Boleto
Negalho

Barriga
Fachada
Carrão
Portásio
Cabeçarra Valseiro
Vestias Palhinhas
Cachucho
Estreito
Inverno Chainça
Palhaça Lérias
Saiote
Vestias
Tacão
Ratola
Brissos
Sandonico Cascalho
Vale de Râ Lauzinha
Minorsa
Tanca Galinha
Xufre
Coelho Rijo
Tendeiro Ameixa
Brilho Faritas
Cerqueiro Repolho
Samouqueiro
Estevainha
Pagarim Lança
Engrossa
Chaveiro
Sota
Limpinho
Chita Ferragem
Ratalho
Rolo Jarreta
Acatis
Verdade Ventinhas


Arcozelo/Gaia, 01 de Julho de 2025

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Nota do editor

Último post da série de 20 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26940: (De) Caras (235): Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades... (Alberto Branquinho, ex-Alf Mil Art)

terça-feira, 17 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26930: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (16): Para recordar; Quadro de Honra; Feridos em combate e Outros que serão sempre lembrados

CCAV 2483 / BCAV 2867 - CAVALEIROS DE NOVA SINTRA
GUINÉ, 1969/70


VIVÊNCIAS EM NOVA SINTRA

POR ANÍBAL JOSÉ DA SILVA


49 - PARA RECORDAR

A amizade entre todos era forte e sincera, que ainda hoje perdura. Mas dada a maior convivência destaco:

- Furriel Jardim, um bom amigo, conversador e conselheiro.
- Furriel Lima e Furriel Oliveira Miranda, os irmãos metralha, sempre pegados como o cão e o gato, mas bons amigos.
- Furriel Baeta, autêntico computador à época, grande memória pois sabia de cor algumas dezenas de números mecanográficos. Passados vinte anos num convívio perguntei-lhe se sabia o meu, tendo respondido de pronto 06026567 e é mesmo.
- Furriel Bettencourt, mais do que enfermeiro foi o médico que nunca tivemos.
- Furriel Brito, o nosso fotógrafo e DJ no quarto de Tite.
- Soldado Xabregas, espirituoso e sempre bem disposto e o poeta que escreveu a letra da marcha de Nova Sintra que começava assim:

Defendemos Nova Sintra
com muito orgulho e altivez
pertencemos à companhias
que é a dois quatro oitem e três
Furs Mil Jardim e Aníbal
Furs Mil Aníbal e Brito
Furs Mil Baeta e Miranda
Cap Bernardo; Lima; Ludovico; Aníbal e Lopes
Capitão Bernardo
Furs Mil Aníbal e Bettencourt

Obviamente não posso deixar de referir o capitão Bernardo, o nosso chefe, amigo de toda a gente, grande condutor de homens, cuja perda prematura foi muito sentida. Jamais esquecerei uma das suas palavras de ordem “à falta de meios avança a imaginação


50 - QUADRO DE HONRA

****** Aqueles que por obras valorosas se vão da lei da morte libertando ******

24 de Julho de 1969 - Soldado José Pedroso de Almeida
24 de Julho de 1969 - Soldado Adelino Sousa Santos
04 de Agosto de 1969 - Soldado Domingos Conceição Verdades Ventinhas
17 de Novembro 1969 - 1.º Cabo José Maria Lomba
17 de Novembro 1969 - Soldado António Abrantes do Couto


51 - FERIDOS EM COMBATE

Cap Cav - Joaquim Manuel Correia Bernardo, em 11/07/69
Fur Mil - José Joaquim Oliveira Miranda, em 24/07/69
Fur Mil - Aníbal José Soares da Silva, em 04/08/69
Fur Mil - Fernando José Barriga Vieira, em 17/11/69
1.º Cabo - Manuel João
Soldado - Isidoro Soares Machado
Soldado - Gabriel Matias dos Santos, em 17/11/69
Soldado - António Augusto Soares Poupada, em 17/11/69
Soldado - Leonel Jorge Pascoal Germano, em 17/11/69
Soldado - Joaquim Marques Batista, em 17/11/69
Soldado - José Maria Silva Soares



52 - OUTROS QUE SERÃO SEMPRE LEMBRADOS

E que entretanto faleceram, após o regresso a casa:

1.º Sargento Josué Júlio Monteiro Ludovico
2.º Sargento José Fidalgo Canaveira
Fur Mil Alberto Augusto Ramos P. Azevedo
Fur Mil José Santos Moreira
Fur Mil Jorge Manuel Frazão Damaso
1.º Cabo Artur Oliveira Soares
1.º Cabo Gregório João Revés
1.º Cabo José Correia
1.º Cabo José Manuel Chambrinho Braz
1.º Cabo Rogélio Carlos Cipriano
1.º Cabo Sérgio Alves Pereira
Soldado Amândio Alves Amaral
Soldado António Francisco Soares
Soldado António Jesus Garcia
Soldado António Augusto Fernandes Poupada
Soldado Carlos Alberto Neves Lourenço
Soldado Fernando Jacinto da Silva
Soldado Gustavo Liz Castro
Soldado João Henrique Martins Boleto
Soldado Joaquim Marques Batista
Soldado José Augusto Batista Rodrigues
Soldado José Guerreiro Estevans
Soldado José Joaquim Alves Cruz
Soldado Leonel Jorge Pascoal Germano
Soldado Manuel Gouveia de Oliveira (Xabregas)

ARCOZELO – GAIA, 01 de JUNHO DE 2020


(FIM)
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Nota do editor

Vd. posts da série de:


4 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26551: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (1) Formação do BCAV 2867 - Partida para a Guiné e Chegada a Bissau

11 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26573: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (2): Partida para Nova Sintra - Chegada a Nova Sintra - Em Nova Sintra

18 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26595: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (3): A Alimentação

25 de março de 2025 > Guiné 61/74 - P26615: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (4): Cantina - Encontros em Bissau e Entretenimento

1 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26636: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (5): Jogos de futebol e voleibol - Natal e Fim de Ano de 1969 e Hotel Miramar e Pensão Xantra

8 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26664: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (6): Pelotão de Caçadores Nativos 56 - Primeira vez debaixo de fogo e Emboscada virtual

15 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26692: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (7): Coluna de Reabastecimento a S. João - Coluna a S. João em 08/12/69 e Colunas de reabastecimento a Lala

22 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26714: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (8): O gerador; O bezerro; Os cães e a raiva; As botas trocadas; As abelhas e As rolas

29 de abril de 2025 > Guiné 61/74 - P26743: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (9): Messe de sargentos; O Correio; A Enfermagem; As Transmissões e A Ferrugem

6 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26770: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (10): Os grandes azares; Insensatez; O ronco; Caso do Furriel Moreira e Chuveiro do abrigo dos Morteiros

13 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26796: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (11): Uma jóia de criança; A Tombó; Abutres e pelicanos e As larvas de asa branca

20 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26820: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (12): O meu acidente

27 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26852: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (13): Comissão liquidatária e Esferográficas Parker

3 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26878: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (14): Tite, Quarto dos Furriéis e Últimos dias em Bissau
e
10 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26904: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (15): A despedida do Quartel de Brá e o Regresso

terça-feira, 10 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26904: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (15): A despedida do Quartel de Brá e o Regresso

CCAV 2483 / BCAV 2867 - CAVALEIROS DE NOVA SINTRA
GUINÉ, 1969/70


VIVÊNCIAS EM NOVA SINTRA

POR ANÍBAL JOSÉ DA SILVA


47 - DESPEDIDA DO QUARTEL DE BRÁ

Todo o Batalhão aprumado e engraxado apresentou-se, sem armas, ao General Spínola.
Depois do discurso de despedida proferido pelo General, seguiu-se a leitura dos louvores para as Companhias. Das quatro, a CCS e três operacionais, só a minha a CCAV 2483, os gloriosos "CAVALEIROS DE NOVA SINTRA", não recebeu qualquer louvor. Mais uma grande desilusão. Se fomos para Nova Sintra porque éramos a Companhia mais bem preparada para lá permanecer os primeiros seis meses, mas acabamos por ficar vinte, com o pior aquartelamento em termos de instalações e o mais doloroso, tivemos cinco mortos em combate e as outras nenhum, salvo a CCS que teve um por acidente com arma de fogo dentro do quartel. Não é de esquecer que o nosso capitão foi gravemente ferido. Sei a razão, naquele momento o nosso Comandante de Companhia era um alferes e o de todas as outras eram capitães do quadro permanente. Quero com isto dizer, que os louvores não se destinavam às companhias, pois estas extinguiam-se à chegada a Estremoz, mas sim aos capitães do quadro que tinham carreiras militares a seguir. Para além duma grande injustiça, foi também uma humilhação, desta maldita guerra.

Ensaio para desfile despedida
Cervajaria Pelicano
Alocução General Spínola
Marginal estrada para Stª Luzia
Catedral de Bissau


48 - O REGRESSO

Embarcamos no navio Úige no dia 22 de Dezembro de 1970. O pessoal estava e continuou eufórico até à chegada a Lisboa. A noite de Natal foi passda a bordo. Para além do jantar habitual, à meia noite foi servida uma ceia, com tudo o que comporta uma ceia daquela noite. Bacalhau com batatas e legumes, bolo rei, rabanadas e outras goluseimas, sem esquecer o tinto e o branco, e o espumante. No dia de Natal o barco foi autorizado pelas autoridades marítimas espanholas a aproximar-se do porto de Las Palmas, sendo visível a marginal, as palmeiras e o movimento automóvel. Chegamos a Lisboa no inicio da noite do dia 28, mas dado que não podiamos atracar, o barco ficou ancorado ao largo. De certeza que ninguém dormiu. Rádios, gravadores e cantoria fizeram-se ouvir toda a noite. De manhã cedo do dia 29, o barco atracou ao cais e começou o desembarque. As malas e os sacos estavam pesados por causa das compras, o que o tornou mais lento. No cais o pessoal desenfreado ía à procura dos seus familiares. Com facilidade encontrei os meus pais e irmã.

É o momento em que não de pode controlar as lágrimas. Seguiu-se o agrupar das tropas para o desfile perante as autoridades militares.

As camionetas da Setubalense esperavam por nós e entrado o último militar iniciou-se a viagem para Estremoz. No quartel, ordeiramente fizemos a entrega do fardamento e efetuadas as demais formalidades finalmente pudemos vestir a roupa civil. Seguiram-se as despedidas sempre emocionadas, com a promessa de encontros futuros, que felizmente acontecem todos os anos. Oa cafés encheram-se para o último copo. Num deles o meu amigo Jardim quis conhecer o meu pai e eu sabia porquê. Tentou convencê-lo a deixar-me ir com ele para Angola, a sua terra natal. Dizia que a avó queria que ele fosse gerir umas fazendas ou roças e pretendia levar-me para o ajudar. Ainda em Nova Sintra ao luar africano, por diversas vezes ensaboou-me a cabeça, procurando convencer-me. Não fui por razões familiares e porque tinha assegurado o regresso ao meu emprego. Grande amigo o Jardim. Por quatro vezes veio ao nosso convívio annual e na primeira emocionei-me com uma lágrima ao canto do olho.

O Úige afastando-se do cais
O cais
A terra à vista são as Canárias
Paz e sossego depois de 22 meses de muita inquietação
O alferes Martinho a mandar acelerar
Continência perante as autoridades

(continua)
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Nota do editor

Último post da série de 3 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26878: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (14): Tite, Quarto dos Furriéis e Últimos dias em Bissau

quinta-feira, 5 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26884: S(C)em Comentários (70): O quarto dos furriéis em Tite... e as maroteiras que pregávamos ao Miranda (Aníbal Silva, ex-fur mil SAM, CCAV 2483, Nova Sintra e Tite, 1969/70)


Guiné > Região de Quínara > Tite > CCAV 2483 / BCAV 2867 (Nova Sintra e Tite, 1969/70 > O quarto dos furriéis...


Foto (e legenda): © Aníbal José da Silva  (2025). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Excertos do poste P26878 (*)



(i) Aníbal José da Silva (Vila Nova de Gaia) (ex-fur mil SAM, CCAV 2482, Nova Sintra e Tite, 1968/69):


O inferno de Nova Sintra ficara para trás e rumámos a Tite para cumprir os últimos três meses de comissão, num quartel com instalações condignas. 

Para além da óbvia dormida, sempre que a atividade operacional permitia, passávamos algum tempo no quarto, umas vezes jogando às cartas, escrevendo à família e sobretudo ouvir música.

Aproximava-se o regresso à Metrópole e alguns já tinham comprado aparelhagens de som. Lembro a do Brito e o famoso Akai do Jardim, que tocavam à vez.

Para além disso também se faziam algumas maroteiras, sendo as principais vítimas o Teixeira e sobretudo o Oliveira Miranda:

  • um dia, ou melhor uma noite, o Miranda, ao regressar dum patrulhamento noturno, ao abrir a porta do quarto, estrategicamente entreaberta, levou em cima da cabeça com uma bacia cheia de água;
  • outra vez colocámos velas acesas nas extremidades da cama dele e sentámo-nos à volta, simulando um velório;
  •  noutra vez o Miranda entrou e verificou que estava tudo calmo; a luz estava apagada e aparentemente toda a gente a dormir: "hum, disse ele, deve estar algum santo para cair do altar e que o que é que estes camelos estão preparados para fazer"... 
  • aparentemente nada, mas sim havia algo....O Miranda foi tomar banho, regressou ao quarto e preparava-se para deitar e disse: "hoje parece que estou safo". Deitou-se e passados dez minutos, sobre a sua cama começaram a cair pingos continuados de água...
  • como uma mola,  levantou-se e foi verificar o que estava a acontecer: alguém que não estava deitado ficou fora do quarto a aguardar que ele tomasse banho e se deitasse; previamente fora instalada uma mangueira que saía duma torneira do chuveiro contíguo ao quarto, que passava sobre o teto falso e pendia sobre a cama; com ele no ninho foi só abrir a torneira;
  • verificada a marosca, regressou ao quarto, fulo,  e a vociferar palavrões dirigidos aos “dorminhocos”. (...) (**)
(ii) Comentário do editor LG:

Aníbal, as "partidas" que pregávamos uns aos outros, mereciam uma série...Incluindo as "praxes"... Quero ver se retomo este tema...
 
Será que estas "partidas" (em geral, inofensivas, como as vossas, em fim de comissão, próprias para "desopilar"...) poderiam ser consideradas uma continuação do "bullying" (como se diz hoje...) que praticávamos na escola ?... As vítimas, na escola, na tropa, no trabalho, são sempre as mesmas: os mais "fracos", os mais "vulneráveis", os "marginais", os "diferentes"...

Falo de "partidas inofensivas", não de praxes violentas e inaceitáveis...

(Seleção, revisão/fixação de texto, negritos, título: LG)
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Notas de leitura:

(*) Vd. poste de 3 de junho de 2025 > Guiné 61/74 - P26878: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (14): Tite, Quarto dos Furriéis e Últimos dias em Bissau


(**) Último poste da série > 28 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26856: S(C)em Comentários (69): A maldição de...Bissássema, no setor de Tite, região de Quínara (Cherno Baldé, Bissau)

terça-feira, 3 de junho de 2025

Guiné 61/74 - P26878: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (14): Tite, Quarto dos Furriéis e Últimos dias em Bissau

CCAV 2483 / BCAV 2867 - CAVALEIROS DE NOVA SINTRA
GUINÉ, 1969/70


VIVÊNCIAS EM NOVA SINTRA

POR ANÍBAL JOSÉ DA SILVA


44 - TITE

É a localidade onde está situada a sede do Batalhão, denominada Companhia de Comando e Serviços (CCS), implantada na região administrativa do Quinara, que dá início à zona sul que é bastante pantanosa. Situa-se a 18 Km de Nova Sintra e talvez 4 a 5 Km do Enxudé, onde existia um posto avançado junto à margem esquerda do rio Geba, que fazia de cais às LDM´s e ao bote que diariamente atravessava o Geba em direção a Bissau. Em redor do quartel havia muitas moranças que constituíam a Tabanca de Tite, sendo as etnias dominantes os "Beafadas” e os “Balantas”.

Vista aérea de Tite
Porta de armas
Convívio de furriéis
Parada e Comando
Refeitório
Festa do Fanado em Novembro


45 - QUARTO DE FURRIÉIS EM TITE

O inferno de Nova Sintra ficara para trás e rumamos a Tite para cumprir os últimos três meses de comissão, num quartel com instalações condignas. Para além da óbvia dormida, sempre que a atividade operacional permitia, passávamos algum tempo no quarto, umas vezes jogando às cartas, escrevendo à família e sobretudo ouvir música. Aproximava-se o regresso à Metrópole e alguns já tinham comprado aparelhagens de som. Lembro a do Brito e o famoso Akai do Jardim, que tocavam à vez.
Para além disso também se faziam algumas maroteiras, sendo as principais vítimas o Teixeira e sobretudo o Oliveira Miranda.
Um dia, ou melhor uma noite, o Miranda ao regressar dum patrulhamento noturno, ao abrir a porta do quarto, estratégicamente entreaberta, levou em cima da cabeça com uma bacia cheia de água.
Outra vez colocamos velas acesas nas extremidades da cama dele e sentamo-nos à volta, simulando um velório.
Noutra vez o Miranda entrou e verificou que estava tudo calmo. A luz estava apagada e aparentemente toda a gente a dormir. Hum, disse ele, deve estar algum santo para cair do altar e que o que é que estes camelos estão preparados para fazer. Aparentemente nada, mas sim havia algo. O Miranda foi tomar banho, regressou ao quarto e preparava-se para deitar e disse, hoje parece que estou safo. Deitou-se e passados dez minutos, sobre a sua cama começaram a cair pingos continuados de água. Como uma mola levantou-se e foi verificar o que estava a acontecer.
Alguém que não estava deitado ficou fora do quarto a aguardar que ele tomasse banho e se deitasse. Previamente foi instalada uma mangueira que saía duma torneira do chuveiro contíguo ao quarto, que passava sobre o teto falso e pendia sobre a cama. Com ele no ninho foi só abrir a torneira. Verificada a marosca regressou ao quarto, fulo e a vociferar palavrões dirigidos aos “dorminhocos”.


46 - ÚLTIMOS DIAS EM BISSAU

No dia 15 de dezembro de 1970 a compamhia seguiu de Tite para Bissau a fim de aguardar embarque para a Metrólole, previsto para o dia 22.
Os últimos dias serviram para fazer compras, principalmente nas lojas dos Libaneses. Rádios, gira-discos, gravadores, relógios, tapetes, artesanato africano e principalmente whisky, muito whisky. Alguns Furriéis, eu incluído, alugamos o espaço de uma casa para servir de armazém. Nas compras, nos restaurantes e cervejarias, tudo servia para gastar os últimos pesos (moeda da Guiné).
Alguém conseguiu autorização para numa tarde desfrutar da água morna da piscina dos oficiais. Foi um regalo, mas o pior tinha acontecido. Quando fomos para os balneários, verificamos que os nossos haveres tinham desaparecido, pois foram roubados relógios, dinheiro e até anéis. Eu fiquei sem um relógio seiko que comparara dias antes, mas já não tinha dinheiro suficiente para comprar outro.

Muçulmanos e cais do Pidjiguiti
Palácio do Governador
Forte da Amura
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Nota do editor

Último post da série de 27 de maio de 2025 > Guiné 61/74 - P26852: Vivências em Nova Sintra (Aníbal José da Silva, Fur Mil Vagomestre da CCAV 2483/BCAV 2867) (13): Comissão liquidatária e Esferográficas Parker